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A mudança climática pelas lentes das mulheres indígenas
ELABORAÇÃO: Jamille Nunes
PUBLICADO EM: 16 de junho de 2021
Com seus trabalhos de guardiãs de sementes e cuidadoras do roçado, as mulheres indígenas contam como enxergam a gravidade dos efeitos da crise climática
A natureza é a casa dos povos indígenas e de suas tradições, por isso, são defensores ambientais tão ativos. Para manterem seus conhecimentos e modos de vida, eles precisam “ler” os sinais das estações, o curso dos rios, as árvores, o comportamento dos animais. “Tem conhecimentos que só as mulheres indígenas têm, e isso precisa ser respeitado e valorizado“, diz Diaka Shawãdawa, do Acre.
Coletoras e cuidadoras do roçado
Em muitos povos, as mulheres indígenas são as coletoras de sementes e cuidadoras do roçado. Isso pressupõe uma relação estreita com as plantas pois, para elas, todos os seres da mata têm espírito, inclusive os vegetais.
Na prática de povos do Alto Rio Negro, por exemplo, a roça é cuidada pelas mulheres. No documentário “Quentura” é possível observar os cumprimentos que as mulheres nativas fazem às manivas quando chegam à roça. “Elas são gente”, diz uma das mulheres. “Quando não fazemos fogo elas ficam tristes. Se as queimamos de qualquer jeito elas choram”, diz outra.
“São as mulheres que coletam frutos, sementes, palhas, cipó. Ao trabalhar com artesanato, com a medicina tradicional, com a plantação na roça, elas estão muito atentas ao ciclo do tempo e às transformações em curso”, conta Sinéia Wapichana, do Conselho Indígena de Roraima.
As mulheres Ikpeng, que coletam para a Casa de Sementes Movimento Mulheres Yarang, também caminham na floresta com cestos e facões, cantando para os espíritos das sementes, e sempre deixam um pouco para os animais, que também são multiplicadores. Elas denominam seu trabalho coletivo como um “trabalho de formiga”, expressão que traduz o significado de “Yarang”. Com o dinheiro da venda de sementes, compram remédios, ferramentas e alimentos.
Lutando contra a degradação ambiental
Além da coleta de sementes, as Ikpeng reflorestam terras que já foram destruídas para virar pasto, sem a ajuda de máquinas. O desmatamento e os incêndios para a agropecuária, a exploração de madeira e o garimpo são os principais responsáveis pela degradação ambiental, mesmo em territórios indígenas demarcados.
Essa destruição, agravadora da mudança climática, desequilibra a “leitura” que essas mulheres fazem da natureza, para seguirem o ritmo e o tempo certo de plantar e colher, por exemplo. Na Amazônia, onde as mudanças de estação são menos delimitadas, elas declaram não saber mais quando é inverno ou verão.
O aumento da temperatura prejudica a biodiversidade, o calendário das chuvas muda, o calor intenso as faz perder plantações. Algumas frutas desapareceram e, atualmente, esses povos precisam comprar alimentos que antes conseguiam da natureza.
Recado para o futuro
Almerinda Tariano, ex-presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), conta que existem cerca de 280 variedades de maniva, graças a uma rede de trocas entre as mulheres. São elas que conhecem seus ciclos de cultivo e suas propriedades, num processo contínuo de experimentação. “Com as mudanças do clima essas variedades correm o risco de se perder”, alerta.
Maria Betânia Macuxi declara: “Vamos segurar as mãos uns dos outros para defender a Mãe Natureza. Porque sem ela, ninguém vive.“
“Este conteúdo não representa, necessariamente, a opinião do Observatório do Clima ou de qualquer um de seus membros.”
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