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COP-26: pontos de atenção e um olhar para populações vulnerabilizadas
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COP-26: pontos de atenção e um olhar para populações vulnerabilizadas
ELABORAÇÃO: Jamille Nunes
PUBLICADO EM: 29 de outubro de 2021
As especialistas Stela Herschmann e Sineia Wapichana contextualizam a primeira Conferência do Clima após o início da pandemia e realçam pontos sensíveis do evento
A 26ª COP – prevista para ocorrer em 2020 – já seria desafiadora, caso não houvesse uma pandemia em curso para elevar a preocupação. Mas ambas – crise climática e crise sanitária – estão interligadas e isso pode se tornar mais evidente na Conferência do Clima de 2021, sediada em Glasgow, na Escócia.
“O evento em si está cheio de problemas esse ano. Até semanas atrás, o Brasil estava na lista vermelha [do país sediador],” lembra a especialista em políticas climáticas do Observatório do Clima, Stela Herschmann, ao contextualizar o que as delegações enfrentam antes de chegar em Glasgow. Ela ressalta a desvantagem enfrentada pelos países do sul global nesses espaços, e como agora isso se agrava, por estarem em condições diferentes de vacinação. “A predisposição esse ano não vai estar muito boa para a conversa”, completa.
Apesar disso, Stela salienta a urgência das pautas. “As metas atuais são para 2030. mas não podemos esperar nem até 2025. A gente precisa de metas mais ambiciosas, e essa deveria ser a principal discussão.”
Em adição às questões estruturais das delegações, Stela destaca outros pontos sensíveis nas negociações da COP-26:
- Ambição climática: relatórios já mostram que no fim de 2020 os países deveriam fazer a primeira revisão de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês). Para o Brasil, isso significou retrocessos nas metas climáticas, no que ficou conhecido como “pedalada climática”. Nem todos os países apresentaram novas NDCs mas, segundo relatório do IPCC, estamos caminhando para um aumento de 2,7ºC até o fim do século, bem acima do limite de 1,5º C. Isso aumenta a urgência de metas revistas antes de 2030, antes até de 2025, segundo Stela. Para continuarmos com a possibilidade de 1,5ºC de aumento da temperatura global, é necessário redução de 45% nas emissões de gases de efeito estufa;
- Financiamento climático: em 2019, países desenvolvidos prometeram disponibilizar 600 bilhões de dólares (100 bilhões por ano) para países pobres. Isso não foi atendido e os números não estão sendo cumpridos. É necessário equilibrar financiamentos de mitigação e adaptação – atualmente, só 20% do financiamento climático é destinado à adaptação -, mas essa porcentagem está defasada, ao levarmos em consideração que já estamos lidando com os impactos da mudança climática. Nas discussões da COP, isso também reverbera no assunto “perdas e danos”: países mais pobres que estão sofrendo impactos têm menos recursos para resolver seus problemas, enquanto países ricos são ágeis. Stela frisa que países ricos têm resistência em falar em indenização climática;
- Transparência e uniformidade: hoje, cada país apresenta metas diferentes, com relatórios de monitoramento diferentes. Para que o mundo possa acompanhar a evolução geral, é preciso uniformizar as NDCs, para tratarem de períodos comuns – por exemplo, com metas definidas para um período de 5 em 5 anos. Assim, a resposta para correções é mais rápida do que em ciclos de 10 anos. Além disso, é necessária uma certa flexibilidade para países adaptarem seus relatórios, métricas, informações: países ricos já têm possibilidades de fazer relatórios transparentes, pois estão acostumados com relatórios de emissão desde Kyoto (1997); os países mais pobres, não.
Quem realmente participa da COP?
Espaços oficiais de negociação e convenções mundiais do clima têm presença massiva de um perfil de homens, a maioria já familiarizado com o poder institucional e que não vêm de territórios ameaçados.
Por isso, quando grupos de populações sub-representadas estão ali, há dois trabalhos a serem feitos: o de levar as demandas até esses lugares e o de trazê-las de volta com qualidade. “Eu faço esse caminho de volta nas comunidades,” declara Sineia Wapichana, do Conselho Indígena de Roraima (CIR), “porque não basta discutir lá, mas trazer de volta pras comunidades de forma entendível. Mitigação e adaptação [por exemplo] são palavras novas, [nós] usamos outras. Povos indígenas não gostam de ‘adaptação’ porque parece ‘adaptar ao outro’; usamos ‘enfrentar’, sobre enfrentar com qualidade, pensar soluções”.
Se hoje Sineia faz a ponte entre seu território e espaços oficiais como esse, ela relembra que a presença dos povos indígenas em locais institucionais veio com muita luta. “Euclides Macuxi, da Coiab, na época, foi o primeiro a chegar em um espaço desses,” ela relembra. Euclides esteve na COP-6, sediada na Holanda, em 2000, junto de líderes indígenas do México e da Bolívia.
Embora lideranças indígenas pleiteassem participação desde a Cúpula da Terra (Rio 92), só a partir dos anos 2000 foi possível a criação de uma instância em que os povos participassem enquanto sociedade civil – um espaço denominado Caucus Indígena. “Caucus” é uma estratégia em que o mediador de uma reunião oficial prepara um momento separado com cada um dos envolvidos em determinada demanda, para criar uma relação mais próxima e confiável e, assim, compreender melhor as necessidades e pontos de vista de cada um. Também pode ser utilizada para reunir informações relevantes para as negociações.
Não à toa, na COP-20, sediada em Lima, aconteceu o 1º Pavilhão Indígena em uma Conferência, com agendas de prioridades. O Acordo de Paris, com todos os seus avanços em relação aos acordos anteriores, trouxe também a novidade de mencionar povos indígenas em seus textos, reconhecendo seus direitos próprios e garantidos, e propondo uma plataforma de reconhecimentos de suas ciências.
Apesar do aparente avanço no papel, Sineia destaca: “Todos perguntam o que levar para a COP, e os povos indígenas têm estratégias de dizer: ‘o que não foi implementado do Acordo de Paris’.” Ela também explicita que a forma como programas de financiamento para indígenas, decididas sem eles, é burocratizada de uma forma que não dialoga com suas especificidades. Por isso, é necessária a pressão para que pessoas da floresta estejam presentes na construção de políticas. “Encorajo que todo mundo participe,” ela completa.
Eventos alternativos para a sociedade civil
A sociedade civil pode participar por meio de eventos online e ao vivo, como a People’s Summit (Conferência do Povo, em tradução livre). Durante a COP, também haverá outros espaços para civis participarem sem credenciamento. O Brazil Climate Action Hub, criado por diversas organizações da sociedade civil brasileira para dar visibilidade à ação climática brasileira, também terá atividades online, inclusive do GT de Gênero e Clima do Observatório do Clima. Acompanhe!
“Este conteúdo não representa, necessariamente, a opinião do Observatório do Clima ou de qualquer um de seus membros.”
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